se quiser saber um pouco mais do mesmo, nada de novo:

Uma nova cara para a universidade brasileira?

Câmara aprova cotas sociais e étnico-raciais. "Vencemos mais uma primeira batalha!"

Vivas à luta do povo organizado! Salve Zumbi e Dandara! O dia 20 de Novembro de 2008 pode entrar para a história. No momento em que militantes de todo o país celebravam o Dia da Consciência Negra, a Câmara dos Deputados aprovava o projeto de lei que reserva 50% das vagas das universidades federais para estudantes de escolas públicas. Parte dessas vagas serão ocupadas por negros e indígenas, de acordo com a proporção étnica de cada estado identificada pelo censo demográfico. A Lei depende de aprovação no Senado.


Um detalhe importante, considerado por muitos como fator altamente positivo, é o artigo que garante recorte sócio-econômico na política de cotas (renda per capta até 1,5 salário mínimo) e exigência aos candidatos de terem cursado todo ensino médio em escola pública! A política de cotas é uma reivindicação histórica do Movimento Negro, que se tornou mais intensa a partir do trabalho desenvolvido pela Educafro e outros movimentos nos últimos anos.


Vencemos mais uma primeira batalha! A aprovação das cotas é resultado da organização popular, da pressão intensa por meio de manifestações, seminários, abaixo-assinados e audiências públicas. Mais do que isso, é fruto do amadurecimento político e social em torno de ações afirmativas como instrumento de transformação social e redução das desigualdades entre negros e brancos.

A Educafro defende as políticas de ações afirmativas, como as cotas nas universidades públicas, sem desconsiderar a necessidade de se fazer investimentos maciços no ensino básico e também políticas de permanência no ensino superior. Há seis anos, desde quando a Educafro intensificou a luta por cotas, entendemos ser necessária a valorização de todos os níveis educacionais. Investir na escola pública não contradiz a luta por cotas. São causas que se somam. Por outro lado, não se pode culpar apenas a defasagem do ensino público pela ausência de negros e pobres no ensino superior. O vestibular é essencialmente excludente e deve ser questionado também. O modelo ideal de vestibular seria aquele que capacidade, vocação e talento dos candidatos e não somente que teve mais acesso à fórmulas e macetes. Caso o Senado Federal também aprove o projeto de lei, as universidades federais terão um prazo de quatro anos para fazer as adequações necessárias.

Por enquanto, a aprovação na Câmara dos Deputados é simbólica, visto que ainda dependemos da aprovação dos senadores. Esperamos que todos os partidos, tanto da base governista, como da oposição, de direita ou de esquerda, mantenham no Senado a mesma postura da Câmara. Só teremos motivos para comemorar quando a lei for sancionada pelo Presidente Lula.


Nos próximos dias a Educafro iniciará uma mobilização de sua base (184 núcleos de cursinhos comunitários em Sâo Paulo) visando a aprovação do Projetos também no Senado!

Teoria e prática contestatória, reflexiva e transformadora


O estudo da disciplina 'Cultura e Cidadania' nos cursinhos comunitários da Educafro: teoria e prática contestatória, reflexiva e transformadora


O que diferencia a Educafro dos outros cursinhos são as aulas de “Cultura e Cidadania” desenvolvidas regularmente em cada núcleo de pré-vestibular comunitário, com carga horária igual ou superior às disciplinas acadêmicas como física, história, português ou biologia. As aulas de cidadania se caracterizam em uma marca do projeto e abordam 10 temas anuais, especialmente selecionados e preparados para a realidade dos alunos provenientes das escolas públicas e do povo negro. Esta é uma herança do PVNC – movimento dos Pré-vestibulares para Negros e Carentes, nascido no Rio de Janeiro na década de 90, anteriormente à Educafro.

O foco didático-pedagógico desta disciplina, baseado na abordagem transversal de conteúdos sociais e étnico-raciais, busca trabalhar os temas com diversidade, através de palestras, dinâmicas, filmes, teatro e seminários em grupo, passando pelas vertentes teóricas e práticas do que representa o termo cidadania para a Educafro. Trata-se pois de um exercício permanente de formação política dirigida a seus participantes diretos (público interno) e indiretos (comunidade do entorno dos núcleos), que se constrói não só nos núcleos, mas em encontros mensais com os professores da área, dirigidos pela Sede da Educafro.

É através das aulas de 'Cultura e Cidadania' que se apresenta aos futuros universitários bolsistas o compromisso ou contrapartida social que terá para com o seu núcleo de origem. Este compromisso diz respeito à participação em eventos, trabalho comunitário (aulas, orientação vocacional ou apoio à coordenação), atos públicos, colaboração financeira simbólica para sustentabilidade da Educafro, aproveitamento acadêmico e formação política permanente, durante o curso de graduação.

Com este trabalho, tanto teórico como prático, busca-se transformar os núcleos em espaços de partilhas metodológicas de experiências pedagógicas, culturais, políticas e sociais. O trabalho em rede incentiva encontros regionais que identificam demandas e bandeiras de lutas locais sem, ao mesmo tempo, se isolar ou perder a perspectiva de movimento coletivo com representação nacional.

Neste contexto inseres a disciplina 'Cultura e Cidadania', cujo conteúdo programático é único para os núcleos de todas as regiões. São exemplos de alguns temas estudados nos núcleos nesta disciplina, os quais o autor teve a experiência de contribuir para a elaboração e o desenvolvimento:

* Violência doméstica e de gênero: um olhar para a mulher afro-brasileira.
* O negro e a mídia: reflexões sobre comunicação de massa e a população Afro-brasileira.
* Quais são os meios disponíveis para a aplicação da lei 10.639 e torná-la efetivada em todos os níveis de ensino?
* Ensino Superior no Brasil, reforma universitária e seus desafios.
* Desenvolvimento sustentável: é possível o Brasil crescer sem destruir o que resta da Amazônia?
* Povos indígenas: sua história e situação atual.
* Criminalização de movimentos sociais e repressão do Estado.
* Saúde da mulher negra e gravidez na adolescência: o que todos/as deveriam saber e fazer?
* O terceiro setor frente a um Estado omisso: substituir ou pressionar?
* Direitos humanos para quem? Raça e justiça no Brasil!
* Violência policial e questões relacionadas a segurança pública.

Com esta prática, os cursinhos comunitários desenvolvem também conteúdos de história da África e cultura afro-brasileira. Por pressão do movimento negro organizado, esta política tornou-se recentemente obrigatória no ensino fundamental e médio, com a Lei 10.639/03.

Os temas são escolhidos através de indicação dos membros dos núcleos (professores, universitários, alunos e coordenadores) e votação em assembléia. O planejamento e a avaliação este trabalho também é feito por meio dos encontros mensais de treinamento e capacitação com professores voluntários, quando são elaborados textos-base referentes aos temas de cidadania de cada semestre. O objetivo destes textos é dar início ao trabalho nos núcleos, que deverá ser complementado com outras abordagens.

O diálogo constante com a comunidade, permite aos educadores de 'Cultura e Cidadania' reelaborarem o enfoque dado aos temas e atualizarem informações com interação com as aulas de História, Redação, Língua Portuguesa e Atualidades. Publicações jornalísticas e artigos de opinião são também objetos de estudo. Também os professores de disciplinas meramente acadêmicas, como Biologia ou Matemática, em muitas situações são desafiados a interagir com o conteúdo de 'Cultura e Cidadania'. A formação politizada, popular e diferenciada dos modelos tradicionais é, por assim dizer, em alguns casos, desafio de todo corpo docente voluntariado.

Em sua organização interna, a Educafro se estrutura através de núcleos de base. É característica marcante dos núcleos de pré-vestibular comunitários da Educafro, a inserção e o diálogo permanente na comunidade local periférica, uma vez que utiliza espaços de uso público, otimizando-os (salões de igrejas, escolas públicas, associações de moradores, salas de sindicatos, centros de defesa de direitos, etc).

Nos últimos anos, inserção do discurso étnico-racial passou de elemento complementar a ocupador de foco central da entidade, fato notadamente difundido entre grupos sociais afins, universidades, órgãos de imprensa e acadêmica especializada no assunto.

No processo de seleção de bolsas de estudo é aplicada uma ação afirmativa da entidade, modo que é acrescida a pontuação de negros e indígenas na classificação para obtenção das bolsas. O objetivo deste favorecimento é ajudar a corrigir as grandes distorções criadas pelas desigualdades que vigoram em nosso país. Esta problemática, envolvendo a discriminação positiva para os participantes dos cursinhos, nem sempre é pacífica ou ausente de polêmica. Ao contrário, traz à tona uma constante necessidade de estudo, debate e conscientização. O conteúdo desta contradição e conseqüente aprofundamento aos temas étnico-raciais são tratados na Educafro através de momentos vivenciais como manifestações públicas, protestos e dinâmicas em grupo.

Nos encontros formativos para professores de cidadania, é refletido que a proposta educacional da Educafro contempla de modo interativo aprendizados teóricos e atividades práticas relacionados à defesa da cidadania e conscientização anti-racista, inclusive com filme, convidados especialistas e cursos livres.

A formação de professores dessa área induz a multiplicar lideranças que entendam ser as aulas da disciplina "cultura e cidadania" mais que momentos de formação, também uma preparação para questões cotidianas orientadas pela Sede da Educafo, no tocante à questões sociais, sobretudo étnico-raciais, na faculdade, vida social e mercado de trabalho.

Os núcleos constituem-se ambiente propício para que o cidadão comum exerça seu papel político em sua comunidade. Busca-se, desse modo, ampliar o olhar macro sobre as realidades e qualificar a ação no seu micro espaço. Partindo da realidade local, provocam mutirões de solidariedade e trabalho voluntário de agentes locais, ajuda mútua entre os participantes, auto-conhecimento enquanto grupo social ativo, protagonismo, conscientização para a questão étnica e oportunidade de convívio com a diversidade (étnica, de gênero, idade e orientação sexual). Como dito anteriormente, é local propício para a formação política teórica e prática, fomento para surgimento de novas lideranças comunitárias, resgate de auto-estima, reforço de laços de afetividade, celebração espontânea das vitórias e cultivo da mística.

Um país fraterno, na acepção franciscana, diverso e sem racismo, na perspectiva do movimento negro e sem desigualdades sociais, como buscam os movimentos sociais, é o que se espera construir no longo caminho ainda a se percorrer na luta da Educafro.

Vestibular de Cultura e Cidadania? Que é isso?

Este é o décimo primeiro ano que fazemos. Mas realmente é uma idéia ainda nova. Não se pautar por quem decora macetes... quem paga... ou quem teve mais acesso a conteúdos descartáveis, típicos do vestibular da Fuvest e outros por aí que não aferem capacidade. O Vestibular de Cultura e Cidadania da Educafro avalia 3200 estudantes de escolas públicas e identifica qualidades outras, como militância, consciência crítica, formação política, disposição para vencer, superação de dificuldades, enfim, encontra talentos que as universidades não encontram.

Diferente dos vestibulares tradicionais, como o da FUVEST, conteúdo cobrado privilegia potencial e não o mérito;

Por Jorge Américo: Neste final de semana, 18 e 19 de outubro, 3200 estudantes, vindos de 49 municípios, fizeram o “Vestibular de Cidadania da Educafro”. A avaliação é parte de um programa de ação afirmativa que ofertará, neste ano, 850 bolsas de estudos parciais e integrais em nove instituições de Ensino Superior. A coordenação informou que a prova foi totalmente digitalizada para que os alunos começassem a se habituar ao uso do computador, visto que muitos ainda vivem em situação de exclusão digital.
A pontuação obtida pelos candidatos não é garantia de conquista do benefício. Outros critérios também são analisados. As mulheres, negros e PNEs são priorizados. A idade (quanto mais avançada, maiores as chances), a situação sócio-econômica e o envolvimento com trabalhos voluntários também ajudam na colocação. Busca-se, assim, atender àquelas pessoas que são barradas em maior proporção pelos atuais mecanismos de acesso à universidade.
Aparecida Gisele dos Santos, 33, terminou o Ensino Médio há 15 anos e só agora pôde retomar os estudos. “Como meu marido está desempregado, acabei me tornando ‘chefe-de-família’. Tenho dois filhos e não posso pagar a mensalidade de uma faculdade particular. Pretendo cursar Direito e a única maneira que vejo de realizar este sonho é através de uma bolsa de estudos”.
O “Vestibular de Cidadania da Educafro” possui características diferentes dos vestibulares tradicionais, como o da FUVEST. Isso porque os conteúdos meramente acadêmicos não tocam no cerne das questões que rodeiam e angustiam a juventude, principalmente aquela inserida em bairros periféricos, onde a presença do Estado é cada vez menor. “Nossa prova é um exemplo de inclusão pedagógica, popular e cidadã. As questões visam continuar o processo de aprendizagem que é desenvolvido em sala de aula. É uma forma de aprender na prática”, explica Adriano Rodrigues, coordenador pedagógico da Educafro.
Cleyton Borges, da coordenação do vestibular revela que o conteúdo cobrado privilegia o potencial e não o mérito. “Enxergamos como sendo mais importante a capacidade de reflexão e não apenas a de assimilação. As questões são elaboradas com base em temas étnico-raciais e contemplam a conjuntura política, econômica e social do país”. Segundo Borges, há uma sintonia com a Lei 10.639/03 (alterada pela Lei 11.645/08), que torna obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas de Ensino Fundamental e Médio.
Desde o surgimento dos primeiros cursinhos comunitários, na década de 80, a disciplina de “Cultura e Cidadania” é parte estrutural da grade pedagógica nos núcleos da Educafro. “A formação política e cultural permeia as demais disciplinas, o que permite construirmos uma base sólida na busca do conhecimento emancipatório e da transformação social”, diz Frei Valnei Brunetto, diretor-executivo da Educafro.
Suellen Marques fez o Vestibular de Cidadania há quatro anos e hoje é bolsista no curso de Administração. Faz parte do grupo de 100 voluntários que se revezaram entre sábado e domingo últimos para cuidar da infra-estrutura e recepção dos candidatos. “As semanas que antecederam o exame exigiram um esforço dobrado. Viramos a noite várias vezes cuidando dos detalhes”.

Quer saber mais? Fale com a gente.

Militar condenado e declarado torturador

Um grande passo na luta por Justiça
Carlos Alberto Brilhante Ustra, coronel reformado do Exército, foi responsável pela tortura dos integrantes da família Teles, durante a ditadura civil militar (1964-1985). Assim entende o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que hoje (9), expediu sentença em que julga procedente o pedido de declaração de responsabilidade de Ustra pela tortura dos ex-presos políticos Maria Amélia de Almeida Teles (Amelinha), César Augusto Teles e Criméia Schmidt de Almeida, que sofreram os abusos no DOI-Codi paulista, nos anos 1970, na época, sob o comando do coronel. Para Aníbal Castro de Souza, que, juntamente com o jurista Fábio Konder Comparato representa os Teles, a decisão do TJ representa uma grande esperança e uma grande vitória para a democracia. "O Brasil, por intermédio do Poder Judiciário reconheceu o direito à verdade acerca do ocorreu efetivamente nos "anos de chumbo". Com isto, consolida a democracia para que todos saibam que ninguém pode agir à margem da lei. A lei de anistia não pode ser um escudo contra impunidade daqueles que desonraram as Forças Armadas", afirmou. Castro comemora a decisão inédita da Justiça brasileira. "Pela primeira vez na história do país, houve o reconhecimento judicial e, portanto, oficial, do Estado brasileiro de que um militar de alta patente teve participação efetiva em torturas contra civis. "Já houve outras decisões reconhecendo indenizações a pessoas torturadas, mas todas eram contra a União Federal enquanto ente jurídico", afirma. Nós que lutamos por Justiça, nos sentimos contemplados com esta decição histórica! Atualmente Amelinha é ativista da causa feminista, na União de Mulheres e PLP - Promotoras Legais Populares.

Vencemos: a homenagem aos que só sobrevivem da Opressão

A gente estuda Bertold Brecht:
Nada é impossível de mudar

"Desconfiai do mais trivial,
na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,
pois em tempo de desordem sangrenta,
de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar."


A gente ouve Taiguara:

Que as Crianças Cantem Livres

"O tempo passa e atravessa as avenidas
E o fruto cresce, pesa e enverga o velho pé
E o vento forte quebra as telhas e vidraças
E o livro sábio deixa em branco o que não é
Pode não ser essa mulher o que te falta
Pode não ser esse calor o que faz mal
Pode não ser essa gravata o que sufoca
Ou essa falta de dinheiro que é fatal
Vê como um fogo brando funde um ferro duro
Vê como o asfalto é teu jardim se você crê
Que há sol nascente avermelhando o céu escuro
Chamando os homens pro seu tempo de viver
E que as crianças cantem livres sobre os muros
E ensinem sonho ao que não pode amar sem dor
E que o passado abra os presentes pro futuro
Que não dormiu e preparou o amanhecer..."




a gente lembra Guevara

Carta aos filhos:
"Queridos Hildita, Aleidita, Camilo, Célia e Ernesto:


Se alguma vez tiverem que ler esta carta, será porque eu não estarei mais entre voçês.
Quase não se lembraram de mim e os mais pequenos não recordarão nada.
O pai de voçês tem sido um homem que atua, e certamente, leal a suas convicções.
Cresçam como bons revolucionários.
Estudem bastante para poder dominar as técnicas que permitem dominar a natureza.
Sobretudo, sejam sempre capazes de sentir profundamente qualquer injustiça praticada contra qualquer pessoa em qualquer parte do mundo.
Essa é a qualidade mais linda de um revolucionário.
Até sempre, meus filhos. Espero vê-los, ainda. Um beijão e um abraço do Papai."

Che

É preciso tapar os buracos dos ratos

Rubem Alves nos dá essa aula sobre eleições e poder

O nome do filme, acho que era “Queijo Suíço“. O Gordo e o Magro estavam sem emprego. Precisavam ganhar dinheiro. Ouviram que a Suíça era um país famoso pelos seus queijos. Pensaram: “Se na Suíça há muitos queijos é lógico que lá deverá haver muitos ratos. Mas ninguém gosta de ratos. E, em especial, os fabricantes de queijos devem odiar os ratos. Se não gostam dos ratos é lógico que a Suíça deve ser um excelente mercado para matadores de ratos.“ Tomaram, então, uma decisão: “Vamos matar ratos da Suíça“.Puseram-se, então, a pensar sobre a tecnologia adequada para matar ratos. Consultaram a bibliografia disponível. Leram sobre um famoso matador de ratos imortalizado pela literatura: um flautista! Aconteceu na cidade de Hamelin que havia sido tomada por milhões de ratos. Eram tantos que gatos e ratoeiras eram inúteis. Pois o dito flautista se livrou deles de uma forma insólita: pôs-se a tocar uma flauta e os ratos, amantes da música, foram hipnotizados, saíram de seus buracos e puseram-se a segui-lo por onde ia. Ele, então, simplesmente entrou no rio que passava pela cidade tocando sua flauta. Os ratos, esquecidos de que não sabiam nadar, entraram também no rio, foram levados pela correnteza e morreram.Mas o Gordo e o Magro não sabiam tocar flauta. Assim, deixaram de lado essa tecnologia musical. Pensaram em usar ratoeiras para matar os ratos. Mas os ratos são espertos. Logo eles aprendem sobre as ratoeiras e não mais caem na armadilha mortal. Examinaram, depois, a possibilidade de usar gatos. Mas os gatos logo se tornam um problema. Multiplicam-se com rapidez idêntica à dos ratos e tornam-se uma peste pior que os ratos, tal como aconteceu no palácio do rei. Além disto, depois de comer todos os ratos a fome dos gatos não cessa e eles passam então a devorar pássaros, que todos amam por sua beleza e canto. Na ausência dos ratos, sabiás, pintassilgos, canários, rolinhas, pombas e curruiras passam a ser a comida diária dos gatos.Descartadas flautas, ratoeiras e gatos, o Gordo e o Magro pensaram: é tolice tentar acabar com os ratos depois que eles entram no quarto dos queijos. O certo é impedir que eles entrem no quarto dos queijos. Mas eles só entram no quarto dos queijos se houver buracos. Ora, se os buracos forem tampados eles não poderão entrar. Não entrando, os queijos não serão comidos. Concluíram, então, que a eliminação científica dos ratos se consegue por meio de uma técnica baseada na dialética entre buracos abertos e buracos tampados.Munidos dessa nova técnica bateram à porta da primeira fábrica de queijos e ofereceram seus serviços. O dono ficou encantado porque havia muitos ratos a comer os seus queijos. O Gordo e o Magro se puseram a trabalhar. A primeira coisa que fizeram foi tirar de sua caixa de ferramentas uma pua grossa com a qual fizeram um buraco redondo no assoalho do depósito dos queijos. O dono da fábrica lhes perguntou: “Para que esse buraco?“ Responderam: “Para os ratos passarem!“ A seguir, tiraram da mesma caixa de ferramentas um tarugo de madeira com o qual tamparam o buraco que haviam feito. “Para que esse tarugo de madeira no buraco?“ perguntou de novo o dono da fábrica. E eles responderam: “Para os ratos não passarem...“Não me lembro do final do filme. Mas sei que o Gordo e o Magro estavam certos: para acabar com os ratos é preciso tampar os buracos por onde entram.Aí eu me perguntei: “Mas quem é que faz os buracos pelos quais os ratos entram no quarto dos queijos?“A resposta é simples: os ratos entram no quarto dos queijos porque nós, cidadãos, fazemos os buracos. Os ratos estão lá por culpa nossa. Os buracos através dos quais os ratos entram são os nossos votos. Os ratos entram no quarto dos queijos democraticamente...É fácil fazer um regime com votos e eleições. Votos e eleições dão a impressão de democracia... Mas não bastam para impedir a invasão dos ratos. Votos e eleições são apenas meios - necessários mas não suficientes - para que a democracia aconteça. A democracia se assemelha a uma obra de arte. Tome a Pietà, por exemplo. Ela não é o resultado de cinzéis e martelos, embora cinzéis e martelos tenham sido usados por Michelangelo para esculpi-la. Mas, antes que cinzéis e martelos fossem usados, foi necessário que a idéia da Pietà tivesse surgido na cabeça de Michelangelo. Os cinzéis e martelos foram apenas os meios usados pelo artista para realizar sua idéia. Assim é a democracia: ela é uma obra de arte coletiva. Começa com as idéias do povo. Votos e eleições são meios para que o pensamento do povo se realize.Aqui se encontra a delicadeza e fragilidade da democracia: para que ela se realize é preciso que o povo saiba pensar. Se o povo não souber pensar, votos e eleições não a produzirão. A presença dos ratos na vida pública brasileira é evidência de que o nosso povo não sabe pensar, não sabe identificar os ratos... Não sabendo identificar os ratos, o próprio povo, inocentemente, abre os buracos pelos quais eles entrarão.Mas, o que é que ensina o povo a pensar? É a educação. O fundamento da democracia é a educação do povo.Os presença dos ratos na vida política brasileira, sendo evidência de que o nosso povo não sabe pensar é, assim, evidência também de que nossas instituições de educação e ensino não cumpriram a sua missão mais importante que é a de ensinar o povo a pensar. Ensinar o povo a pensar: isso não se identifica nem com a transmissão de conhecimentos e nem com a produção de pesquisas.É hora de perguntar: o que há de errado com a educação no Brasil? Se a educação não cumprir a sua missão o povo não aprenderá a pensar e estaremos condenados a conviver permanentemente com os ratos. E, infelizmente, não é possível chamar o Gordo e o Magro para tapar os buracos por onde os ratos entram... (Folha de S. Paulo, Tendências e Debates, 18/06/2001.)

Pesquisas em Educação, Pedagogia e Vestibular

Orientação Pedagógica da Educafro
Esta é uma seção que pretende oferecer aos os professores uma lista de sítios de bibliotecas que possam contribuir com as suas pesquisas e para difusão da cultura. Se você conhece algum site que não consta nessa lista.


Baixe livros e teses
http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/PesquisaObraForm.jsp
http://www2.fpa.org.br/portal/modules/news/index.php?storytopic=1700
http://www.teses.usp.br/
http://www.zequinhabarreto.org.br/CN03/biblio_marxista/biblio_marx.asp


Site específico para o vestibular
http://www.fuvest.br/
http://www.comvest.unicamp.br/index.html
http://www.vunesp.com.br/


Baixe livros para vestibular
http://www.estudantes.com.br/bib_virt.asp


Bibliotecas virtuais
http://prossiga.ibict.br/bibliotecas/
http://sitededicas.uol.com.br/biblio.htm
http://www.unicamp.br/nipe/litera.htm


Material por disciplina
http://www.bibvirt.futuro.usp.br/textos/didaticos_e_tematicos

Sites referentes à Matemática:
www.ime.usp.br/caem
www.ime.usp.br/lem
http://pessoal.sercomtel.com.br/matematica/
http://www.rpm.org.br/
http://www.somatematica.com.br/

Sites referentes à Química
http://www.qmc.ufsc.br/

Sites referentes à Biologia
http://www.cve.saude.sp.gov.br/
www.pnud.org.br/home

Sites referentes à Física
http://www.ifi.unicamp.br/

Revista Carta Capital na escola
http://www.cartanaescola.com.br/online


Apoio ao professor
www.portaldoprofessor.mec.gov.br
www.objetoseducacionais.mec.gov.br


Universidades públicas de São Paulo
http://www.usp.br
http://www.ufabc.edu.br/
http://www.unifesp.br/
http://www.unicamp.br/
http://www.unesp.br
http://www.ufscar.br
http://www.cefetsp.br/lwp/workplace
http://www.fatecsp.br/


Testes e provas de vestibulares
http://www.fatec2007.com.br/vestibular/provas%5Fanteriores/
http://www.fuvest.br/


Institutos de pesquisa
http://www.inep.gov.br/

MEC
http://portal.mec.gov.br/index.php

Memórias burras nunca esquecem

Este texto é do grande escritor Rubem Alves.
Muitos já o conhecem. Alguns afirmam que Alves diz o óbvio.
Mesmo o óbvio, tem que ser dito por alguém.
Agradecemos a ele por isso.

É duvidoso que um professor que há anos se dedica a pesquisas de biologia molecular ainda se lembre de como resolver problemas estatísticos de genética. Também os professores dos cursinhos: cada um passaria brilhantemente na disciplina de sua especialidade. Mas também é duvidoso que um professor de português consiga resolver problemas de química ou física. Com eles, os professores que elaboram as questões que os alunos terão de responder. Para eles, vale o que foi dito sobre os professores dos cursinhos. Por fim, os diretores das empresas que preparam os vestibulares...

Essa hipótese desaforada poderia ser testada facilmente: bastaria que os personagens acima mencionados se submetessem aos vestibulares. Claro: seria proibido que se preparassem. O objetivo seria testar o que foi realmente aprendido. O que foi realmente aprendido é aquilo que sobreviveu à ação purificadora do esquecimento. O aprendido é aquilo que fica depois que o esquecimento faz o seu trabalho...

Vestibular: porta de entrada para a universidade? Seria bom se sua função se limitasse a isso. O sinistro está não no que é dito, mas no que permanece não dito: os vestibulares são um dragão devorador de inteligências cuja sombra se alonga para trás, cobrindo adolescentes e crianças.

Desde cedo, pais e escolas sabem que a escola deve preparar para os vestibulares. Os vestibulares, assim, determinam os padrões de conhecimento e inteligência a serem cultivados. Mas não existe nada mais contrário à educação que os padrões de conhecimento e inteligência que os vestibulares estabelecem.

O escritor Mário Prata escreveu uma crônica sobre as meninas jogadoras de vôlei. Era uma crônica leve, bem-humorada, picante. Era impossível não sorrir ao lê-la. Lida, ficava para sempre na memória, pois a memória guarda o que deu prazer. Passados alguns meses, ele voltou ao assunto da primeira numa crônica dirigida, se não me engano, ao então senhor ministro da Educação. É que sua primeira crônica fora usada, na íntegra, num exame vestibular.

Para um escritor, ter uma crônica transcrita, na íntegra, num exame vestibular, equivale a uma consagração. Mário Prata estava felicíssimo. Exceto por um detalhe: os examinadores, para transformar sua crônica em objeto de exame, prepararam uma série de questões sobre ela, cada uma com várias alternativas de resposta. Mário Prata resolveu, então, brincar de vestibulando. Tentou responder às questões. Não acertou uma! (Eu me saí pior do que ele. Tentei responder às questões, mas houve algumas que nem mesmo entendi!)

Se o vestibular fosse para valer, ele teria zerado no texto que ele mesmo escrevera. Ele se dirigiu, então, ao senhor ministro da Educação comentando esse absurdo. E perguntou se não teria sido muito mais inteligente se os examinadores, gramáticos, tivessem pedido que os moços escrevessem um parágrafo sobre seu artigo. Aqueles saberes esotéricos que lhes eram pedidos nunca teriam qualquer uso em suas vidas. Compreende-se que, como resultado do seu preparo para os vestibulares, os jovens passem a detestar literatura.

Minha filha queria ser arquiteta. Como não havia outro caminho, matriculou-se num cursinho. Eu a via sofrer tendo de memorizar coisas que não lhe faziam sentido. Fiquei com dó e, por solidariedade, resolvi fazer um sacrifício: passei a estudar com ela. Estudei meiose e mitose, as causas da Guerra dos Cem Anos, cruzamento de coelhos brancos com coelhos pretos... Estudei também, contra a vontade e sem interesse, a necropsia da língua chamada análise sintática. Não sei para que serve. E dizia à minha filha, à guisa de consolo: "Você tem de aprender essas coisas que você não quer aprender porque a burocracia oficial assim determinou. Mas não se aflija. Passados dois meses, quase tudo terá sido esquecido. Só sobrarão os conhecimentos que fazem sentido...". Pergunto a você, meu leitor: de tudo o que você teve de estudar para passar no vestibular, o que sobrou?

Por que nós, professores universitários, não passaríamos no vestibular? Por termos memória fraca? Não. Por termos memória inteligente. Burras não são as memórias que esquecem, mas as memórias que nada esquecem... A memória inteligente esquece o que não faz sentido. A memória viaja leve. Não leva bagagem desnecessária.

E aí eu pergunto: se nós, professores já dentro da universidade, não passaríamos nos exames vestibulares, por que é que os jovens, que ainda estão fora, têm de passar? É irracional. Especialmente em se considerando que irá acontecer com eles aquilo que aconteceu conosco: esquecerão... Haverá uma justificação pedagógica para esse absurdo? Ainda não a encontrei.

http://www2.uol.com.br/aprendiz/n_colunas/r_alves/id270303.htm


Sobre o que se diz sem dizer

Encontrei isso a algum tempo.
Ficou guardado na gaveta.

Sobre o que se diz sem dizer

"Que rara beleza era aquela, que não se compra em banca de revista e quase não se vê na novela." Sexta-feira. Havia parado de garoar. O ônibus seguia nem tão cheio, nem tão vazio, sempre acelerado, o mesmo caminho, igual a todo dia. A moça seguia em seu silêncio-introspecção, lá no fundo, com o seu fone de ouvido, seu olhar distante mirando o nada pela janela, Viajando de pé (só eu e mais 2 passgeiros), eu a via sentada no penúltimo banco. Ela fazia poucos sinais com os dedos, com a cabeça, como quem acompanha a música, em ritmos alternados, ora mais rápido, ora mais lento. Ela tinha um jeito... uma beleza meio jogada, distraída. Nisso, eu me distraí, observando a menina que ouvia o seu MP3 e acabei passando do meu ponto . Pensei: "melhor ir até o final mesmo e depois voltar. Tô sem nada pra fazer em casa mesmo!"

E olhando pra rua, tentando espairecer, flagrei uns moleques jogando bola num terreno. Acabava de abrir um solzinho meio fraco. de fim de tarde em fim de inverno. "Como eu queria tá no meio deles". Consegui um lugar pra sentar. Bom pelo cansaço, mas ruim porque eu não teria mais como olhar mais para aquela jovem. Houve uma freiada brusca. Um susto geral . Aí pensei: "será que eu tô ficando apaixonado?" Mais uma parada, eu olho pra trás. Lá está ela, enigma no rosto, cabelo black, corte e penteado afro, solto, unhas pintadas, mochila cor de laranja, tênis, calça jeans, anel de casca de côco, colar preto, brincos em forma de sol, batom quase imperceptível, um rosto ao mesmo tempo dócil e cansado, terno e sério, com a marca do tempo e aparentando criança, que idade teria? Em que estaria pensando? Que música ouviria? "Que rara beleza, que não se compra em banca de revista e quase não se vê na novela". Quando o ônibus faz uma curva e pára no próximo ponto, sobem várias pessoas ao mesmo tempo. Vários estudantes, um homem, um casal de idosos, uma mulher nova com criança no braço e uma senhora de uns 45... 50 anos, tornando o espaço um pouco mais concorrido. Esta senhora tinha um sorriso aberto, encantador e olhos concentrados. No clima leve e desligado que eu vinha nos últimos minutos, fiquei ali parado, observando cada figura, cada um e cada uma que entrava na condução, um bêbado, um aposentado... De repente percebi que a minha nova amiga, do fone de ouvido, lá do fundo, havia sumido. Desceu sem dar notícia. Beleza-passageira. De onde teria vindo? Para onde foi? Bem do meu lado, estava a senhora que falei, aparentado seus 45 anos. Não quis assentar. De pé, com seu vestido colorido, tipo colcha de retalhos, cheio de detalhes em luas e estrelas, tirou algumas balas caseiras do bolso e as ofereceu, pedindo ajuda. Falava com um belo sotaque do norte. Algo assim do Pará ou Amazonas. Poucos compraram. Fiquei com algumas e saltei antes do final. Resolvi voltar a pé pra casa. Há tempo não caminhava à noite pelo bairro.

Não parei de pensar no silêncio-intuitivo da moça e seu rosto indecifrável. E também no vestido colorido da senhora das balas e mãos calejadas. Esta última, por fim, me transmitiu um ar sereno, caboclo-indígena, de quem sabe o que está fazendo e tem a exata noção do que é viver. Teria vindo há quanto tempo? Teria filhos? Netos? Teria outro trabalho que não vender balas? E aquele vestido... tantas cores... fortes como as cores sul-americanas... seriam as cores de seus antepassados? Seriam retalhos costurados de cada marca latina que a cidade grande faz em seus moradores de passagem?

Quem sabe um dia re-encontro essas duas mulheres e aprendo um pouco mais sobre a vida e o quanto temos a obervar naquilo que poucos vêem, nos momentos simples, no que se diz sem dizer.

Passa tempo, escrever na condução

2 pequenos rascunhos de algum tempo atrás.
Um dia ainda passo a limpo:

Passa Tempo

(1997)
Corre por aí, companheiro,

Corre sem fronteira

Olha pra frente

Muita estrada inda falta

Olha pra trás

Muito chão já passou

Corre por aí, companheiro,

Corre, que vem o vento perseguir

Corre, se não passa o tempo

Corre que um dia chega lá

Lá chegando, passatempo será,

Fazer trova,

Tocar moda,

Ficar tranquilo, namorar.


O céu, da condução... o riso, exceção.

(2002)
Eu percebia que ele era do tipo de motorista quieto, sempre atento, seguindo seu caminho com cautela. Chamava minha atenção o fato que a cada parada ele dava uma rápida olhadela pro ceú, bem rápido mesmo, e um segundo depois volta ao ofício. Uma senhora que veio sentar-se ao meu lado me fez lembrar que ainda ontem eu pensava em amores que aparecem na vida da gente e levantam a poeira. Escrevia eu sobre o vento. Hoje vejo a confusão de desencontros urbanos e a metamorfose causada por estes amores.
Assim, contemplo o céu. O céu também é mutante, pois fica preto, azul, vermelho, laranja, amarelo, quase-branco... qual é a cor do céu, nesse minuto, nessa meia-hora entre quinze pra seis e seis e quinze? Possui o céu multifaces, a cada momento se transforma, a cada segundo se misturam multicores e a diversidade se acentua a cada instante. Agora, noitinha que chega, é quase hegemônico o azul-marinho, que também começa a se metamorfosear.
Olho ao redor as pessoas vindo do trabalho, voltando pra casa e outras indo trabalhar, estudar. Vejo uma uniformidade no balaço dos corpos e também no semblante e no silêncio. Por mais perto, encostadas que estejam as pessoas que fazem o mesmo itinerário, não significam que são próximas. Não há proximidade! Como aqui é diferente lá do interior. Lá, o comum é puxar um papo... saber quem está do seu lado, sua família, donde vem de pr´onde vai. Aqui não. Cada um se fecha no seu mundo. Até mesmo o motorista no rápido instante em que olha pro céu.
Sabe, assim como as várias e diferentes cores do sol no anoitecer é o sentimento de cada pessoa. Cada um que tem seu jeito de ser, seu modo de amar. Cada um que percebe a maneira especial de lidar com os demais e sabe que sentir só de um jeito não é sentir. Sentir, leigo que sou, penso, é viver a diferença, a multidimensão sentir isso e sentir aquilo, sentir assim e sentir assado, sentir aqui e sentir acolá. Veja, não é difícil, descobrir o sentimento é o mesmo que descobrir o céu e ver os multicamihos da emoção. Anular as diferenças e aprisionar um sentimento é matar e morrer.
Mais que observar o motorista por alguns minutos, naquele agitado fim de tarde de sexta passei a olhar o céu paulistano, limpo, por exceção naquele dia, preparando a chegada de uma rara noite de estrelas. Faça isso também: olhe o céu durante um dia, suas cores, seus mistérios. Veja as transformações repentinas que ocorrem, assim como as que ocorrem em nossos sentidos e sentimentos de cada pessoa.

Esta historinha boba, me fez rir. A Capital faz isso: muda a face, o humor, o rumo e a pulsação das pessoas, fazendo do belo, raridade e do riso, exceção.

CW

Jornalismo de Ficção...

Jornalismo de Ficção, Democracia Racial e outras mentiras

O Negro e a Mídia: reflexões sobre comunicação de massa e a população afro-brasileira.
Por se dizerem um grupo de empresas de comunicação que luta pela liberdade de imprensa no Brasil, as Organizações Globo deveriam ser favoráveis ao debate racional. Na prática, evitam o enfrentamento e ridicularizam a luta pela inclusão social. De maneira covarde, a Ação Afirmativa foi abolida do noticiário e virou piada no programa humorístico "Casseta e Planeta". Em sua nova campanha publicitária, as "Organizações Tabajara" se apresentam como "a única empresa que tem na logomarca uma letra afrodescendente admitida pelo sistema de cotas". Tamanho impropério fez pairar uma dúvida sobre a expressão "humor inteligente". Talvez por genialidade, talvez por burrice, as Organizações Tabajara acabam satirizando as Organizações Globo. Uma faz o que a outra finge não fazer: vende produtos obsoletos a pessoas com preguiça de pensar e de agir.
As Organizações Globo ora ridicularizam, ora espalham temores do surgimento de um possível ódio racial. Servem-se das falácias de dois extremistas e da inacabada teoria da Democracia Racial para defender sua política anti-inclusão. Usam o cinismo do seu assustador de criancinhas e comentarista oficial, Arnaldo Jabor, para dizer que "somos todos iguais". Não bastasse mentir em rede nacional, ainda encomendam teses "por atacado" de um sujeito que se tornou um perseguidor voraz da Ação Afirmativa com recorte racial. Ao contrário do que prega o Sr. Demétrio Magnoli, os intelectuais afrodescendentes (financiados pela Fundação Ford) não dividiram a sociedade brasileira em raças. Eles apenas tiveram sensibilidade e faro científico para perceber que o Brasil está racialmente dividido há mais de 500 anos. Para enxergar isso, não é necessário ser doutor em Geografia Humana pela USP. Qualquer aspirante a militante do Movimento Negro conhece de cor a história da cor no Brasil.

Um pesadelo aterroriza a alta cúpula da "Fábrica de Sonhos". Se aprovado o Estatuto da Igualdade Racial, todas as empresas de comunicação –inclusive as Organizações Globo– estarão obrigadas a abrir 20% de seus postos de trabalho aos afrodescendentes. É possível que as telenovelas não comportem tamanha oferta de mão-de-obra. Afinal, não há tantos banheiros a serem lavados nem tanta grama a ser aparada no setor de figuração. Na área do jornalismo, talvez não seja tão difícil substituir o insubstituível William Bonner. O competente Heraldo Pereira (reserva oficial) não seria tão ingênuo e insensato a ponto de comparar o público do telejornal mais assistido do país ao Homer Simpson. Nas palavras do garoto-propaganda e editor do "Jornal Nacional", o referido personagem da ficção lhe serve de inspiração na fabricação das notícias que entrarão no ar. Em essência, foi dito que o povo brasileiro deve se sentir honrado por ser comparado a um sujeito que nunca leu um livro e segue cegamente os preceitos de uma religião chamada Televisão.
A prepotência das Organizações Globo atingiu um nível tão "elevado" que o ilusionista e chefe de jornalismo Ali Kamel tenta, por meio de um trabalho especulatório, refutar o que o cineasta Joel Zito Araújo prova cientificamente. O primeiro lançou uma coletânea de artigos publicados no jornal "O Globo", no qual ataca e tenta desqualificar toda tentativa de se promover a inclusão social de negros por meio da Ação Afirmativa. Ironicamente, "Não somos racistas" é o título do livro. De maneira desavergonhada, a personagem "Gislene", da telenovela "Duas Caras" (exibida depois do "Jornal Nacional"), apareceu mais de uma vez lendo esse mesmo livro. Gislene, interpretada pela atriz Juliana Alves, é vista como uma jovem politicamente engajada e contrária a qualquer forma de preconceito. Definitivamente, não sabemos onde termina o "Jornal Nacional" e onde começa a "novela das oito". É uma fronteira tênue que só pode ser percebida graças aos "reclames do Plim-Plim".
No campo da Ciência, Joel Zito Araújo –em sua pesquisa de doutorado em Ciências da Comunicação que virou livro– prova (usando estatísticas e fatos concretos) que os negros têm sido ignorados na televisão brasileira ou são retratados de maneira estereotipada. "A negação do Brasil - O Negro na Telenovela Brasileira" mostra que num período de duas décadas, apenas 29 das 98 tramas exibidas possuíam personagens negros. Zito dá destaque a uma das maiores violências morais já sofridas pela população afrodescendente do país. No ano de 1969, a Rede Globo exibiu a telenovela "A cabana do Pai Tomás". O protagonista era um negro interpretado por Sérgio Cardoso, branco de nascimento. Para viver o personagem, o ator e também roteirista (que na época era considerado um dos maiores galãs da televisão brasileira), teve seu corpo pintado de tinta preta e usou rolhas para alargar o nariz e o beiço. Na ocasião, Milton Gonçalves, negro de nascimento, já era considerado um dos maiores atores nacionais e (conforme a crítica especializada da época) tinha plenas condições de protagonizar a telenovela. Mesmo que a arte seja um manancial inesgotável para múltiplas interpretações da vida do mundo, não há licença poética que justifique tamanho desvario.

Ainda que muitos tentem provar o contrário, as clarividências mostram que as Organizações Globo preferem esconder as mazelas do país a ajudar a eliminá-las, seja na ficção, seja no jornalismo. Quisesse, mobilizaria suas equipes de reportagem para retratar a vida dura dos afrodescendentes que vivem sobre palafitas nos mangues maranhenses. Para citar um exemplo da degradação da vida e do desrespeito aos Direitos Humanos, o caranguejo come a bosta do homem, que depois come o caranguejo. Tudo isso acontece sob o reinado e descaso de um dos homens mais poderosos da história do Brasil, o coronel e ex-presidente da República e do Senado Federal José Sarney.

O Jornal Nacional e os demais veículos de comunicação precisam dizer que mais de 60% da população do estado do Maranhão vive abaixo da linha da pobreza. Ou seja, mais de 3,5 milhões de pessoas precisam enriquecer para chegar a ser pobres. Coincidência ou não, os dados do último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que 72% da população daquele estado é afrodescendente. Na região, está concentrado o maior número de comunidades quilombolas do país. Contrariando os interesses dos latifundiários, esses quilombolas podem ser beneficiados pela Ação Afirmativa que as Organizações Globo e seus sequazes tentam barrar no Congresso Nacional. Não há nada mais anacrônico, nem nada que justifique a existência das capitanias hereditárias e das palafitas no século 21. Ingênuos e astutos de todo o mundo, ouvi: Onde há latifúndio, há miséria!
É fundamental que os leigos e os letrados entendam que os defensores da Ação Afirmativa não reivindicam privilégios. A luta é pela dignidade e pela possibilidade de se poder ter acesso às oportunidades em pé de igualdade. Ação Afirmativa não é apenas incluir afrodescendentes no Ensino Superior e no mercado de trabalho. Ação Afirmativa também é matar a fome, o piolho e a lombriga. Ação Afirmativa não é a cura para as doenças sociais. Ação Afirmativa é terapia paliativa. Tem o mesmo efeito da pinguinha barata que se toma no lugar do café-da-manhã. Não sara, mas alivia a dor.

Jorge Américo

um dia como hoje *


Acordou cedo. Não queria atrasar de jeito nenhum. Tomou café preto. Quase esqueceu de levar a tal “apostila de cidadania” pela qual pagou três reais. “Gente, este é o preço de custo, da fotocópia”. O trajeto levaria mais ou menos uma hora e meia até o centro. Ao entrar no ônibus viu um lugarzinho pra sentar no fundo. “Vai dar pra tirar um sono”. Antes de se ajeitar começou a folhear a apostila de umas dez páginas: “Essa apostila tem por finalidade informá-lo(a) sobre os princípios e a filosofia que norteiam o projeto Educafro, com os textos Sete atos oficiais que decretaram a marginalização do povo negro no Brasil e Universidades públicas e ações afirmativas...”
Acordou cedo, mais cedo do que o normal. Desprezou o café da empregada. O pai o apressou. “Te deixo no ponto, vamos! Você parece que não sabe o valor que eu pago nesse colégio”. Pegou de relance o encarte da aula especial de história. Calçou o Hellbender novo e foi. O percurso de ônibus seria uns 40 minutos. “Será que aquela menina vai na festa hoje? O esquema é ir de carro na festa... sem carro não rola”. Abriu o livrinho em qualquer página. “Capítulo 8: A geração de maio de 68”. Passou para uma folha um pouco antes e leu: “os principais líderes da Revolução Cubana, em 1959, eram jovens, entre eles, Ernesto Guevara, que aos 20 anos de idade já percorria o continente com o amigo Alberto Granado...”
Acordaram bem cedo, como era costume. “Gente andando pra lá e pra cá na rua pertuba”. O sinal que um fez pro outro era de confirmação. O mais velho apontou para o ônibus que vinha. Subiram no ônibus os dois e ficaram perto do cobrador. “Você leva a caixa de doce, e eu cuido do resto, mano, certo?”
“Putz meu, tem que estudar mais se quiser ir pra fora fazer medicina. Será que rola mesmo? Se não for medicina, vai turismo ou farmárcia. É melhor ir pra fora e ter liberdade. Demorou!”. Voltou na parte do livro sobre 1968: “a juventude de Paris protestava com a mesma força que outros jovens ao redor do mundo. Nesta época também eclodiam fortemente os movimentos por igualdade racial nos Estados Unidos”.
Apesar de cochilar um pouco lá fundo, o susto com a lombada fez o sono sumir. Voltou a ler a tal apostila. “Será que vai ser rápido esta palestra?” Uma parte ilustrada chamou atenção: “Quem se preocupa apenas com quantas horas se estuda, esquece do desperdício de tempo de estudo. Uma hora de estudo com qualidade vale mais do que 5 horas sem qualidade – dica do William Douglas para a Educafro”.
Passou um ponto mais movimentado e algumas pessoas desceram. “O que é isso, como que vai passando ser pagar assim?” É melhor ficar quieto cobrador!” “Motô, segue seu roteiro que vai ser rapidinho aqui”. E apontou a arma (debaixo da camisa?) para o cobrador. Umas senhoras gritaram, sem saber como reagir. “Pessoal, presta atenção só na caixa de doce que eu tenho pra vender aqui... esquece o resto, nem olha pro colega não, ele vai ser rápido”. “Mano, vem polícia aí na frente, corre, vamo!” E deu um empurrão em quem tava em pé, foi pro fundo e quando a velocidade diminuiu, pulou fora. “Filho da puta, cê amarelou?” Correu também, tirando a mão da camisa. Não tinha arma nenhuma, não tinha nada, aliás, nem experiência, nem coragem de roubar. Vontade? Mais ou menos... Necessidade? Muita.

Uma senhora: “tem que levar pra cadeia mesmo, bater!” O rapaz do colégio rico sussurrou: “é tudo preto fedido...” O cobrador: “pegaram os dois, olha lá, se deram mal, levaram os caras.” Alguém no canto: “como que pode uma coisa dessa? Aquilo é marmanjo.” O rapaz da apostila de cidadania não disse nada, apenas ficou percebendo os detalhes de cada cena, cada nuance, decodificando a realidade exposta.
Houve mudança na política da FEBEM. O diretor daquela Unidade era outro. O discurso, porém, o mesmo. O monitor que os recolheu também era outro, mas nem perceberam seu semblante. Ali era o lugar-comum. “Cara, foi vacilo, foi mal”. “Na próxima vez a gente...” O funcionário: “Os meninos são novos no pedaço, né?” Melhor falar menos, certo? Os dois!”

Desceu no Anália Franco. Era dia de festa no colégio, com atividade especial de manhã e simulado à tarde. “É hoje meu, nem aqui eu fico”. E foram vários, do terceiro colegial para a lanchonete. Dali para o shopping, caixa-automático e cinema. Cigarro e cerveja era comum. Mas queriam conhecer algo diferente. De outras fontes, outros negócios. “Trouxe o dinheiro?”
Desceu no parque Dom Pedro e foi a pé até a Riachuelo. “Sejam bem-vindos! O projeto Educafro, que é muito mais que um pré-vestibular, acolhe vocês com alegria. Quem não adquiriu a apostila de cidadania pode levantar e retirar ali na mesa. Meu nome é Heber e a gente preparou um slide para vocês acompanharem melhor o conteúdo”. Ele tomou água, escolheu um bom lugar e ficou pensando nos dois jovens. Reparou: “são negros como eu. Caramba, a maioria é mulher”. No microfone: “Antes disso pessoal, eu queria perguntar uma coisa: quem aqui tem um sonho?” CWB

"Mesmo que eu tenha que cruzar terras e mares
Eu vou pra Palmares, Eu vou pra Palmares
Mesmo que no caminho me sangrem os calcanhares
Eu vou pra Palmares, Eu vou pra Palmares
Mesmo que os inimigos contra nós sejam milhares
Eu vou pra Palmares, Eu vou pra Palmares
Enfrento os Borba Gato e os Raposo Tavares
Eu vou pra Palmares, Eu vou pra Palmares..."

poema de Dugueto Shabazz

*Nome de uma canção da banda Ira!, de Edgar Scandurra.

Josías, Helton e Roberta são nomes fictícios


Josías, de Santa Catarina: Ele nunca reclamou de ter que trabalhar e nem tinha preguiça, mesmo sabendo que o seu pai não lhe pagaria um "tostão" para que fosse o seu ajudante. Foi na roça que ele aprendeu a lidar com medidas, pesos, distâncias e com as linguagens da natureza. Encantamento. O dia começava cedo para Josías. Sempre foi assim. Quando o pai disse que precisava dele trabalhando, a rotina se sacramentou. A mãe o "derrubava" da cama às 4:15 e antes das 5:00 Josías já estava com a enxada ou o restelo na mão. Determinação.

O tempo passou. Mesmo sem fazer cursinho encarou o vestibular na Capital. Passou na 4ª chamada. Na vida de universitário, acordar cedo não era problema. Os pais de Josías deram o aval para o garoto optar pelo curso no período matutino. Logo no terceiro mês de faculdade, a seleção para o estágio no IBGE confirmou a expectativa dos professores de Josías. Ele foi aprovado em 2° lugar na prova e pôde então ocupar-se das 13:00 às 18:00 horas com um trabalho envolvente, dentro do seu campo de estudo. Foi lá que conheceu a nova namorada Luana, uma das poucas alunas negras do curso de Odontologia na Federal, com quem conheceu a cidade de Floripa, em seus inesquecíveis passeios de domingo.

Helton, do Rio de Janeiro: Cala a boca! Já pra fora! Pra fora! Helton tinha ainda 7 anos. Não havia opção senão acatar a ordem. Voltava pra favela triste por não sair na mesma hora que seus coleguinhas, mas feliz (curiosamente feliz) por não precisar ficar mais nenhum minuto perto daquela professora loira que tanto o infernizava. Desespero. A vida de Helton e dos meninos do morro quase sempre foi "barra pesada". O objetivo da maioria era ter aquilo que tinham os "donos da quebrada", normalmente traficantes: Poder. Para os meninos de 9, 10, 12 anos, ter poder era simplesmente ter armas e várias namoradas ao mesmo tempo. O sonho verdadeiro, utópico, era jogar no Flamengo, no Vasco ou cantar em um grupo de samba. Ilusão.

Para Helton, ser o filho mais velho o tornava um pai-irmão dos outros 6 mais novos. Passar da 8ª série, lembrando sempre dos gritos da "carrasca", foi inusitado. Fazer o colegial foi mais bacana, talvez por ter os três colegas "playboys" na sua sala, que lhe davam atenção. Esses três colegas eram a exceção na sala. Às vezes, Helton até levava a maconha pra eles.

O tempo passou. Quando viu a cara do pessoal da sua turma no primeiro ano de Medicina na UERJ, mesmo já estando com 27 anos (6 anos "parado" e 2 anos de cursinho comunitário), ele lembrou dos colegas "classe- média" do colegial. A diferença era que ele e os outros três alunos negros da sala eram a exceção agora. Helton não trocava a tarde de sábado por nada, já que era único momento em que podia brincar com o irmãozinho mais novo (o sétimo... fruto do namoro novo da mãe). Adorava colocar o jaleco no menino e pedir para o "pretinho" consultá-lo e lhe dar receitas pra comprar remédio...

Roberta de São Paulo: Os dias de chuva chegavam a ser engraçados (isso se não fossem trágicos). A escola de Roberta era a "campeã" do bairro em vidros quebrados e também em pichação. Além das infiltrações na parede, a "chuva de vento" fazia chover dentro da sala, inclusive na carteira de Roberta. Da 6ª série ao 1° colegial, a turma de Roberta teve inúmeras trocas de professores e professoras. Química, inglês, física, geometria... só nos livros. Naquela escola tinha de tudo, menos aula. Comédia?

A região metropolitana oferecia grande facilidade de deslocamento entre uma cidade e outra, para quem procurava emprego. Por pelo menos três vezes Roberta recebeu indicações de amigas para ir trabalhar em casa de família. A mãe dela, analfabeta, diarista desde os 15 anos de idade, foi contra. Disse que enquanto a filha não terminasse os estudos, não iria permitir que ela trabalhasse fora. Numa reunião na escola, em época de enchente, a mãe de Roberta brigou com a Diretora e o conselho da escola decidiu chamar os pais (que estavam desempregados) para reformar o prédio. Muita gente deu o nome, mas só dois apareceram. Vexame.

O tempo passou. Quando Roberta passou no vestibular de uma faculdade pública nem mesmo os professores acreditaram. Que faculdade era aquela que o pessoal da escola nem conhecia? Na formatura da sua turma, muito mais do que uma citação feita pelo reitor ou a emoção durante a fala da oradora, foi o abraço na mãe que a sacudiu por dentro: Engenheira! Recém aprovada no concurso público federal, uma das melhores notas da turma!

Um pouco mais sobre o tema: O professor universitário Marcelo Stratemberg, pesquisador da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), realizou estudos em vista de fornecer àquela instituição de ensino público federal subsídios acerca de diferentes métodos de ações afirmativas. A UFSC estava disposta a usar sua autonomia para adotar algum mecanismo que diminuísse o fosso abismal de desigualdade de acesso a seus cursos, principalmente entre brancos e negros. Verificou-se, com projeções e sérias pesquisas acadêmicas, que o modelo ideal é o de reserva de vagas, único capaz de garantir o ingresso de negros nos cursos da UFSC. Marcelo, que estudou também a proposta de bônus ou pontuação acrescida (como USP e Unicamp), concluiu que o melhor modelo para quebrar a tradição excludente é a reserva mínima de 20% das vagas para negros. A universidade percebeu que a adoção de cotas apenas com caráter social (estudantes da rede pública), não garantiria acesso de negros. Escolas particulares e filhos de famílias ricas de Santa Catarina ingressaram na Justiça contra o sistema de cotas. Mobilizaram-se em defesa de seus seculares privilégios. Perderam. Perderam feio. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou que a autonomia da universidade deve ser preservada neste caso.
Josías, personagem deste texto, só alcançou a aprovação no vestibular por causa do sistema de cotas. Ele foi o primeiro membro de sua família de colonos pobres do oeste catarinense a fazer um curso superior. Assim como Josías, outros milhares de jovens oriundos de escolas públicas ingressaram em 51 universidades públicas brasileiras que adotam ações afirmativas para pobres, negros, indígenas, mulheres, portadores de deficiência física, filhos de policiais, professores da rede pública, etc... com diferentes métodos, mas sempre com intenção de diminuir as desigualdades e cumprir o papel social da universidade. Parabéns à UnB, UFPR, UFBA, UEMS, UEMG, UFPE, UEBA, UEGO, UFRN...
A primeira universidade pública a adotar cotas no Brasil foi a UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, no vestibular de 2002/2003, juntamente com a UENF – Universidade Estadual do Norte Fluminense. O jovem Helton, citado no texto, faz Medicina na UERJ, que está avaliando os resultados dos 5 anos do sistema de cotas. Logo no primeiro ano, uma pesquisa demonstrou que, em geral, as notas dos cotistas (ingressantes por meio de cotas) são maiores do que as notas dos não-cotistas. O índice de evasão (desistência) entre aqueles que estudaram em escolas particulares, é maior do que entre os cotistas (negros, indígenas e estudantes de escolas públicas)3. Hoje, inicia-se um novo ciclo, um novo perfil social de profissionais formados pelas universidades estaduais do Rio.
A imprensa noticiou, em fevereiro de 2008, que no vestibular da USP/FUVEST o curso de Medicina teve apenas um negro (preto) na lista de aprovados. Há anos o percentual de aprovados da rede pública é quase zero nos chamados "cursos de elite". A USP nega-se a adotar qualquer medida com recorte étnico-racial e insiste no falido INCLUSP, alvo de ação do Ministério Público e que, pelo segundo ano consecutivo provou ser ineficaz quanto a seu propósito inicial: incluir estudantes da rede pública, dentre os quais, os negros, historicamente excluídos da maior universidade pública do Brasil.
Também na Grande São Paulo, há quilômetros de distância da USP, a garota Roberta, a qual se referiu este texto, freqüenta as aulas na Universidade Federal do ABC (UFABC) que, desde sua criação, em 2005, reserva 50% das vagas para estudantes da rede pública, sendo 30% para negros, em atenção ao percentual de negros no Estado de São Paulo. Todas as universidades federais presentes no Estado de São Paulo aprovaram o sistema de cotas. A primeira foi a UNIFESP – Escola Paulista de Medicina, que ampliou 10% do número de vagas e as reservou para estudantes negros. Recentemente a UFSCar também aprovou a reserva de 20% de suas vagas para estudantes negros. Na USP, negros não passam de 9% (somados os pretos e os pardos), em âmbito geral. Nos cursos de Direito, Odontologia, Administração, Publicidade, entre outros, são invisíveis. Ou melhor... às vezes 1, 2 ou 3 alunos negros, quase sempre africanos em programas de intercâmbio. Por que tanta exclusão? Por que fugir da responsabilidade diante de um problema tão grave? É o dinheiro da coletividade que mantém a USP. Já não basta ter constatado que o desempenho acadêmico dos egressos de escolas públicas tem sido melhor? Medo de conflitos étnico-raciais? Ou manutenção de privilégios e espaços de poder? O que leva a Reitoria da USP a ser tão conservadora e elitista?
Josías, Helton e Roberta são nomes fictícios. Poderiam ser verdadeiros. Pessoas como eles talvez não tenham a chance de ler este texto. Quem sabe suas histórias se repitam numa das esquinas da vida, nas histórias de Juliana, André, William, Grace, Joana, Maria, José, Paulo César, Fábio, Everton, Antonio Carlos, Janaína, Fernanda, Joaquim, Graziele, Marcelo, Francisco, Geralda... tantos que sonham em entrar numa universidade e as universidades lhes fecham as portas e jogam no lixo suas capacidades e talentos.
Tanta gente caminha por esse mundão e procura o seu rumo, o seu lugar. E se, de repente, a gente se encontrar e puder caminhar junto? Muito mais do que esses meninos e meninas das periferias do Brasil, o fato é que milhares de lutadores estão alcançando o direito de estudar por causa das ações afirmativas e das cotas.
Iniciar a carreira universitária é apenas o primeiro passo em busca da inclusão! A responsabilidade das universidades e do Estado para com a inclusão social e étnica é bem maior do que aquilo que está sendo feito hoje. Estão deixando muito a desejar. Há muito que se fazer. Ainda vamos cobrar muito da USP, UNESP, UFMG, UFRJ e demais universidades que, com a sua omissão, perpetuam a discriminação, o racismo, a exclusão social, as desigualdades. Nossa luta e desafio são grandes. Como cantava Raul Seixas: Baby essa estrada é comprida... a gente ainda nem começou! CWB

"auto-consciência".


17-06-08. Esta é uma poesia grande, com cara de texto de jornal, escrita a 6 mãos. Jogue umas palavras no papel (ou no teclado). O dia do aniversário está entre os mais fortes para deixar o coração falar o que quer. Faça hoje um balanço (sem exagero, claro) do que passou, assuma um compromisso alcansável para o próximo e celebre, celebre o dia, sozinho, com sua companheira ou companheiro, com as lembranças, com as memórias. Tem que ser assim. Os últimos anos estão sendo bons demais. Nós (a turma toda) somos e estamos prósperos, saudáveis vanguardas em tudo. Sem modéstia, há um bom futuro pela frente. Vejo chácaras... crianças... bons filmes.. boas músicas.. violões afinados... risos e gente feliz por todo lado. Sem contar que daremos conta de jogar futebol. Há sim. Tempo houve que lamentei ter nascido depois de uma geração interessante. hoje vejo que nascemos num período de gestação de uma nova geração ('pois que sonhe, a que há de vir...'). temos tudo pra conciliar as "questões políticas" com esses valores indispensáveis da vida e do lazer. No dia do seu aniversário, ou no dia do meu, do dela, do nosso, seja qual for, quero pra você e pra mim tudo o de melhor que possa existir. Tudo o que Deus inventou e fez no mundo pra dar alegria. De cada coisa que existe, uma beleza se tira e pode ser transformada em presente. Mesmo que eu levasse tudo pra você, ou roubasse tudo pra mim, seria pouco. Quero pra você, tudo o que tenho. Quero pra você, tudo o que você queira, Tudo aquilo que sonhar e um dia espera ter, tudo o que já tem, que tenha em dobro e um pouco mais, caso dê felicidade por um minuto ou por toda a vida. É bom dizer sempre e ouvir: "Sou muito feliz por estar do seu lado". Como brinca o Rubem Alves, "Só quero um presente... Vocês crianças, quando pensam em aniversário, dão risada e ficam felizes. Aniversário é dia de festa e presentes. Toda criança quer que o tempo passe depressa para ficar mais velha, deixar de ser criança e ficar adulta. Acham que ser criança é coisa ruim, porque crianças não são donas do seu nariz, não fazem o que querem. Bom mesmo é ser grande. Os grandes fazem o que querem e não precisam pedir permissão. Criança é passarinho sem asas. Adulto é passarinho com asas: voam bem alto e vão aonde as crianças não podem ir. No dia do aniversário as crianças olham para frente: imaginam que está chegando o dia quando elas terão asas e poderão voar. Pois esse dia chegou. Meu aniversário me diz que agora sou velho. Ser velho tem vantagens. Uma delas é ser avô. Vocês só existem porque eu deixei de ser criança e fiquei velho. No dia do meu aniversário os números vão mudar, como mudam no rodômetro, aquele aparelhinho no painel do carro que marca a quilometragem. Está lá "67" e aí, de repente, o "7" dá um pulo e o "8" aparece no seu lugar. Esse é um jeito de marcar o tempo, contando os números. Jeito bobo. Os números não dizem nada. Há um verso sagrado que diz: "Ensina-me a contar os nossos dias de tal maneira que alcancemos corações sábios." Muita gente envelhece sem ficar sábio. O que é um sábio? Sábio não é quem sabe muito. Sábio é quem come a vida como se ela fosse um fruto saboroso. O sábio presta atenção nos prazeres e alegrias de cada momento. E o que dá prazer e alegria não são coisas grandes, festas com bolo, bexigas e presentes. O que dá alegria são coisas pequenas. Por exemplo: brincar com um cachorrinho. Balançar num balanço. Andar na água fria de um riachinho. Ver um ipê florido. Ler um livro. Armar um quebra-cabeças. Ver fotografias antigas". Se tiver que ser por um só dia, que seja hoje, se tiver que ser a vida inteira, que se renove a cada amanhecer, o presente mais importante: a paixão e o sentimento de pertença ao mundo dos sorrisos. "É, cumpadre meu, que te dizer? Já sabes, mais tarde passo aí pra um abraço". êta vida boa e boba, meu pai, de ficar velho, de ficar mais moço. De ficar mais, moço, ficar mais... ficar mais... ficar mais... ficar mais...

O Velho e o Moço
Rodrigo Amarante

Deixo tudo assim.
Não me importo em ver a idade em mim,
Ouço o que convém.
Eu gosto é do gasto.

Sei do incômodo e ela tem razão
Quando vem dizer que eu preciso sim
De todo o cuidado.

E se eu fosse o primeiro
A voltar pra mudar o que eu fiz.
Quem então agora eu seria?

Ahh tanto faz! E o que não foi não é,
Eu sei que ainda vou voltar... Mas, eu quem será?

Deixo tudo assim, não me acanho em ver
vaidade em mim.
Eu digo o que condiz.
Eu gosto é do estrago.

Sei do escândalo e eles têm razão.
Quando vem dizer que eu não sei medir,
nem tempo e nem medo.

E se eu for o primeiro
a prever e poder desistir do que for dar errado?

Ahhh, ora, se não sou eu quem mais vai decidir
o que é bom pra mim?
Dispenso a previsão.

Ahhh, se o que eu sou é também
o que eu escolhi ser aceito a condição.

Vou levando assim.
Que o acaso é amigo do meu coração
Quando falo comigo, quando eu sei ouvir...

O Velho e o Novo
Taiguara


Deixa o velho em paz
Com as suas histórias de um tempo bom
Quanto bem lhe faz
Murmurar memórias num mesmo tom

A sua cantiga, revive a vida
Que já se esvai
Uma velha amiga, outra velha intriga
E um dia a mais

Vão nascendo as rugas
Morrendo as fugas a as ilusões
Tateando as pregas
Se deixa entregue às recordações

Em seu dorso farto
Carrega o fardo de caracol
Mas espera atento
Que o céu cinzento lhe traga o sol

Ele sabe o mundo
O saber profundo de quem se vai
O que não faria
Pudesse um dia voltar atrás

Range o velho barco
Lamento amargo do que não fez
E o futuro espelha
Esse mesmo velho que são vocês